Pode parecer uma contradição um planeta chamado Terra ter sua maior extensão coberta por água, assim como também é difícil imaginar que esse recurso possa acabar. Mas a realidade é alarmante: menos de 1% da água doce está disponível para consumo humano.
No Brasil, um dos países mais ricos em recursos hídricos, o desperdício, a poluição e a má gestão ameaçam esse bem vital. Usar água com responsabilidade deixou de ser um ato ecológico — tornou-se uma questão de sobrevivência.
A situação atual: muita água a vista, mas pouca para consumo
Um fato preocupante, embora 70% da superfície terrestre seja coberta por água, apenas 2,5% é doce, e menos de 1% está realmente acessível para consumo.
O Brasil concentra cerca de 12% da água doce superficial do planeta, mas enfrenta sérios problemas de distribuição, infraestrutura precária e desperdício.
Estima-se que 96,54% da água que existe no mundo esteja no mar. Há também muitos lagos salgados e presume-se que mais da metade da água subterrânea também seja salgada.
No cômputo geral, portanto, podemos dizer que 97,5% da água que existe é salgada.
Apesar de o sal poder ser separado da água por meio de usinas de dessalinização, recorrer a tal procedimento só se justifica em casos extremos, devido, principalmente, ao dispêndio descomunal de energia no processo.
Entre os 2,5% do volume restante, há ainda muita água que não é salgada, mas que não é propriamente doce.Trata-se da água salobra, caracterizada por possuir uma concentração moderada de sal.
Esse tipo de água pode ser encontrado em diversos ambientes aquáticos, como lagos, lagoas, deltas, pântanos, e também no solo.
Estimativa da distribuição de água no mundo (fonte: Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico – ANA)
Embora as técnicas de dessalinização de águas salobras sejam mais simples que as de água salgada, continuam sendo financeiramente dispendiosas, principalmente por conta da energia requerida pelos processos.
De certa maneira, podemos considerar como sendo doce toda água que não é salgada e, também admissível considerar que 2,5% da água que existe no mundo é doce.
Acontece que mais de 2/3 da água doce fica nas geleiras e na cobertura permanente de neve sobre as montanhas e as regiões polares.
O aproveitamento dessa água pela sociedade exigiria um esforço significativo de transporte, com consumo energético potencialmente superior ao necessário para os processos de dessalinização.
Resta ainda quase 1/3 da água doce existente. Contudo, mais de 96% dessa água doce restante está confinada nos poros ou entranhada nas fissuras das rochas subterrâneas, em formações conhecidas como aquíferos.
Cerca de 20% da água mundial vem de fontes subterrâneas, segundo estudos confiáveis.
O esforço utilizado para a captação da água subterrânea é inferior ao que seria necessário para obter a mesma quantidade de água por meio de dessalinização ou de transporte de geleiras.
Infelizmente, boa parte da água doce encerrada em depósitos subterrâneos está em repouso há milhões de anos e, uma vez utilizada, não é devolvida aos locais em que jazia.
De maneira similar ao que ocorre com o petróleo, essas águas (conhecidas como águas fósseis) constituem um recurso não renovável.

Na imagem acima, as áreas mais vermelhas indicam as localizações onde o nível da água subterrânea diminuiu, e as áreas em azul indicam onde os níveis de água subterrânea aumentaram.
As perdas e ganhos incluem mudanças em toda a água armazenada em aquíferos, gelo, lagos, rios, neve e solo. Existem alguns aquíferos de água doce que são naturalmente recarregados pela chuva, por exemplo, e, se forem bem administrados, teoricamente podem fornecer água de boa qualidade indefinidamente.
Ainda resta um pouco de água doce (pouco mais de 0,3%). Porém, mais de 3/4 desse volume restante são placas de gelo flutuantes, estão em pântanos ou em forma de umidade do solo na maioria permanentemente congelado.
O acesso a essa água também exigiria um esforço considerável por parte da sociedade.
A outra quarta parte que restou está nos rios e nos lagos, na atmosfera — em forma de vapor e de nuvens — e na composição do corpo dos vegetais e dos animais da Terra.
Afinal, sobra água ou está em falta
Uma das conclusões que podemos considerar, até certo ponto, é de que existe abundância de água disponível no mundo.
A quantidade de água doce refere-se apenas a valores médios, pois pesquisas demonstram que a distribuição de água doce no planeta Terra é desigual.
Por um lado, nas selvas tropicais da Amazônia, do Congo e de Bornéu, por exemplo, há abundância de água e uma variedade enorme de fauna e flora.
Já em oposição, nos desertos de Atacama, Gobi e Saara, a água é escassa, resultando em poucas espécies de plantas e animais. A vida terrestre prospera onde há abundância de água e escasseia onde a água é rara.
De qualquer forma, com sua distribuição não uniforme, a água doce que existe é suficiente para a manutenção da fauna e da flora existentes na natureza.
Assim foi durante milhões de anos. Porém, a difusão da humanidade em praticamente todos os quadrantes da Terra, o surgimento das comunidades humanas nos mais diversos lugares do mundo, a diversidade de tarefas dos grupos da sociedade.
O desenvolvimento tecnológico e a rede cada vez mais emaranhada de atividades humanas passaram a exigir, cada vez mais, grande variedade de usos da água.
Existem regiões como a Amazônia que possuem uma vasta quantidade de água doce e baixa densidade populacional, enquanto no Sertão do Nordeste, os rios frequentemente secam completamente e há uma concentração significativa de habitantes.
A água doce nem sempre é potável
Na região Sudeste do Brasil, há problemas seríssimos com relação à má qualidade da água. Existem diversas doenças cuja principal via de transmissão é a água.
São as chamadas doenças de veiculação hídrica. Dessa forma, água doce não significa água limpa para consumo.
Também tínhamos visto que a água se movimenta o tempo todo. Tal propriedade da água faz que, mesmo em lugares em que há normalmente água em abundância, surjam às vezes épocas prolongadas de estiagem, com consequências às vezes devastadoras.
Há períodos em que o excesso de água pode provocar sérios desastres, como a inundação das várzeas dos rios e os deslizamentos nas encostas de morros e montanhas.
Assim sendo, do ponto de vista da civilização, concluímos que a água, devido à sua mobilidade e à sua distribuição não uniforme, deve ser considerada como sendo um recurso limitado, cujos usos devem ser planejados da maneira mais eficiente possível.
Qualidade comprometida: poluição e falta de saneamento
A qualidade da água está diretamente ligada à saúde da população e à estabilidade ambiental. No Brasil, cerca de 35 milhões de pessoas vivem sem acesso à água tratada, e 47% dos esgotos não são tratados.
Em muitas áreas urbanas e rurais, rios e córregos se tornam destinos de esgoto e lixo.

Dados relevantes
O consumo de água no Brasil é de 148,2 litros por pessoa/dia, acima dos 110 litros recomendados pela ONU para necessidades básicas.
- 7,5% das crianças e adolescentes têm acesso à água em casa, mas sem garantia de filtragem ou procedência segura.
- A cada 100 litros de água captada para abastecimento, perdemos quase 40 litros por vazamentos e falhas no sistema.
Reutilização e preservação das fontes hídricas
A coleta de água da chuva, o reuso de efluentes tratados e a proteção de nascentes são soluções viáveis e sustentáveis. A tarifa de água e esgoto deve refletir seu verdadeiro valor e financiar melhorias estruturais. Cidades que investem em programas de proteção de mananciais e educação ambiental têm obtido bons resultados.
A Fundação das Bacias PCJ, por exemplo, relata impactos significativos da crise hídrica de 2014-2015, afetando inclusive o setor industrial.
Tecnologias e práticas que fazem a diferença:
- Captação da água da chuva para uso não potável (como irrigação e descarga sanitária);
- Reuso de efluentes tratados em indústrias e condomínios;
- Proteção de nascentes e matas ciliares que abastecem rios e represas;
- Educação ambiental em escolas e comunidades.

A solução depende de um compromisso coletivo
Cada litro economizado faz diferença. Cuidar da água é um compromisso compartilhado entre governos, empresas e cidadãos. Desde pequenas ações, como fechar a torneira ao escovar os dentes, até cobrar investimentos em saneamento, todas as atitudes contam.
A sobrevivência das futuras gerações depende da forma como lidamos com a água hoje. A consciência ambiental é o primeiro passo para evitar o colapso hídrico.
Lembre-se sempre: “A água que você desperdiça hoje pode fazer falta amanhã.”
Tecnologia espacial no monitoramento
hidrológico no Brasil

Com o objetivo de fortalecer a Rede Hidrometeorológica Nacional, a Agência Nacional de Águas (ANA) está trabalhando no desenvolvimento da aplicação tecnológica denominada Hidrologia Espacial, em parceria com a entidade francesa Institut de Recherche pour le Développement (IRD).
Esta técnica permite monitorar condições hidrológicas quase em tempo real em áreas inacessíveis, usando dados de satélites.
As estações virtuais substituem as físicas, reunindo parâmetros de qualidade da água e níveis dos rios além de dados como concentração de sedimentos e partículas em suspensão.
A aplicação desta tecnologia apresenta vários benefícios, entre os quais estão:
- atuação rápida para minimizar os efeitos de eventos críticos, como secas e enchentes;
- economia de recursos (não requer instalação nem manutenção de equipamentos em solo);
- possibilidade de preencher lacunas em séries históricas de estações convencionais (recuperação de séries temporais desde o início do funcionamento dos satélites);
- e o monitoramento de rios em áreas remotas ou conflituosas.

Os dados obtidos por satélites estão disponíveis no portal HidroSat (https://hidrosat.ana.gov.br/), onde usuários podem visualizar e baixar informações de rios e açudes das bacias hidrográficas brasileiras.
Por: Redação Zygbau
Arte: Zygbau
Fotos: Freepik
Fontes: ANA e NASA/CALTECH